sexta-feira, 13 de agosto de 2010

experiência de escrita 5

(continuação do texto publicado aqui)

Saio para a rua e deambulo por entre rostos perdidos na imensidão desta tristeza colectiva que se adensa na mesma medida em que tentamos aprofundar a sua razão. Farei parte deste colectivo anónimo que se atropela por entre caminhos inconsequentes? Não o creio, embora a permanência da lembrança do que aconteceu mo recorde incessantemente, me martele continuamente as têmporas, obrigando-me a contemplar o vácuo em que a minha vida se tornou e o abismo para onde converge. Quisera ter decidido de modo diverso, ter voltado um passo atrás e recusado contemplar o negro profundo que se escancarava perante os meus olhos, forçando-me a mergulhar num remorso sem precedentes.
Fugir, em suma, ter corrido com toda a energia que me restava na altura e da qual ainda guardo um pequeno farrapo, de modo a que tudo pudesse ter sido diferente deste agora irreversível que me aprisiona e sufoca, impedindo-me de vislumbrar nem que seja uma ténue réstia de esperança.
Mas continuar, é preciso.
Apercebo-me novamente destes rostos cansados da multidão imensa que me rodeia. O que faço aqui? Tento fixar um único olhar que seja, mas apenas o vazio me retribui o olhar. Tento, uma e outra vez, encontrar um qualquer vislumbre de humanidade nesta massa informe e sem sentido. Por instantes, creio detectar uma centelha de reconhecimento, mas de tão ténue que é, desmorona-se em fragmentos de algo que nunca chegou a existir.
Não sei que faça, nem a quem me dirija.
Preciso de um cigarro como de uma tábua de salvação encontrada no mar alto e calmo que me levará a lado nenhum. Imersa por instantes nesta imagem e no destino que me aguarda, acordo para a realidade do fósforo aceso que me começa a queimar os dedos.
Apesar de tudo, sabe bem reencontrarmo-nos neste apelo à realidade, ainda que por entre breves e entrecortados instantes, perdidos que estamos nesta encruzilhada de caminhos sem fim à vista.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

experiência de escrita 4

(continuação do texto publicado aqui)

Não posso sair, não posso. Não posso sair de casa sem ele, mas não o consigo encontrar, no meio desta confusão que se tornou o meu espaço. Recordo, por segundos, o tempo em que nada disto era assim, em que todos os acontecimentos da minha vida eram ordenados e reflectidos, quando nada era deixado ao acaso. Por míseros segundos, fragmentos de como tudo era antigamente, dissipam-se em breves instantes para darem lugar à triste realidade de hoje, à ausência de um fio condutor que me direcciona, neste caminho sem sentido, de múltiplos trilhos que me transportam para um único e errático fim.
Procuro, procuro, no meio do caos desordenado que esta casa se tornou, e, às tantas, encontro o caderno onde registo a minha vida, os meus tormentos, onde desenho percursos possíveis para uma fuga deste labirinto insondável, sufocante, omnipresente. Mas por mais que trace linhas sem paralelo na realidade, delineando um percurso difícil e penoso, pleno de cruzamentos sem intersecções, depois de vaguear por círculos intermináveis e submergir em espirais infindas que me transportam ao abismo, regresso sempre ao mesmo ponto de partida – o da inutilidade da procura, da imensidão que se desbarata na conquista do nada, na vacuidade definida em acidentes de percursos inexistentes.
Tenho de sair daqui, e depressa.
Tranco a porta atrás de mim e deambulo pelas escadas imundas, encardidas de tantos outros a traçarem percursos idênticos, escada acima, escada abaixo, sempre a caminharem para o mesmo triste destino que aqui não se encontra, porque o ar é demasiado opressivo para que o consigamos aprisionar. Haverá alguma coisa na vida que nos pertença de facto…? Não, não é aqui, nesta imundície de almas que se atropelam entre si e que nos incomodam, até termos de dizer - Basta! Larguem-me que eu não vos pertenço!
Tenho de sair daqui!

(continua aqui)