terça-feira, 21 de setembro de 2010

experiência de escrita 6

E de novo a tristeza se agiganta por torrentes de fingida decepção, remetida ao silêncio entre tormentos que se avultam pelos degraus da inconsciência, e calam fundo num instante silencioso que intensifica a dor que outrora senti. É penoso voltar a pensar no assunto, remoer sem sentido no lodaçal que se adensa agora, por me ter submergido um dia, ainda que por breves e dolorosos instantes. Pensar é-me doloroso, reflectir penoso e tristemente trivial, mesmo sem que me possam indiciar qualquer hipótese de reflexão inconsciente, em momentos de negra depressão que, a momentos, se aproxima e me agarra, com garras tão afiadas quanto as gélidas torrentes do vale que nunca pude contemplar.
Tão pueril e tão maduro, simultaneamente, que interna e externamente se digladia em discussões sem nexo, sem propósito, que só me fazem recuar e recolher ao obscuro sentimento da frustração e da sempiterna incompletude, dos caminhos negados e dos obstáculos que me aprisionam no nada em que me sinto.
E tudo porquê, para quê? Para isto, para um zero absoluto dentro de um inconstante nada e de um omnipresente vazio que se vai adensando num buraco negro sem fim e sem retorno. Para nada.
Quem dera por vezes a indulgente fragilidade de sucumbir e o talento para desistir, livre e conscientemente, perante qualquer obstáculo em vista. Quão mais fácil seria fenecer e deixar que a energia se extinguisse de um momento para o outro. Presentemente, a minha consome-se na frustração de não poder agir e na impossibilidade de conseguir reagir.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

experiência de escrita 5

(continuação do texto publicado aqui)

Saio para a rua e deambulo por entre rostos perdidos na imensidão desta tristeza colectiva que se adensa na mesma medida em que tentamos aprofundar a sua razão. Farei parte deste colectivo anónimo que se atropela por entre caminhos inconsequentes? Não o creio, embora a permanência da lembrança do que aconteceu mo recorde incessantemente, me martele continuamente as têmporas, obrigando-me a contemplar o vácuo em que a minha vida se tornou e o abismo para onde converge. Quisera ter decidido de modo diverso, ter voltado um passo atrás e recusado contemplar o negro profundo que se escancarava perante os meus olhos, forçando-me a mergulhar num remorso sem precedentes.
Fugir, em suma, ter corrido com toda a energia que me restava na altura e da qual ainda guardo um pequeno farrapo, de modo a que tudo pudesse ter sido diferente deste agora irreversível que me aprisiona e sufoca, impedindo-me de vislumbrar nem que seja uma ténue réstia de esperança.
Mas continuar, é preciso.
Apercebo-me novamente destes rostos cansados da multidão imensa que me rodeia. O que faço aqui? Tento fixar um único olhar que seja, mas apenas o vazio me retribui o olhar. Tento, uma e outra vez, encontrar um qualquer vislumbre de humanidade nesta massa informe e sem sentido. Por instantes, creio detectar uma centelha de reconhecimento, mas de tão ténue que é, desmorona-se em fragmentos de algo que nunca chegou a existir.
Não sei que faça, nem a quem me dirija.
Preciso de um cigarro como de uma tábua de salvação encontrada no mar alto e calmo que me levará a lado nenhum. Imersa por instantes nesta imagem e no destino que me aguarda, acordo para a realidade do fósforo aceso que me começa a queimar os dedos.
Apesar de tudo, sabe bem reencontrarmo-nos neste apelo à realidade, ainda que por entre breves e entrecortados instantes, perdidos que estamos nesta encruzilhada de caminhos sem fim à vista.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

experiência de escrita 4

(continuação do texto publicado aqui)

Não posso sair, não posso. Não posso sair de casa sem ele, mas não o consigo encontrar, no meio desta confusão que se tornou o meu espaço. Recordo, por segundos, o tempo em que nada disto era assim, em que todos os acontecimentos da minha vida eram ordenados e reflectidos, quando nada era deixado ao acaso. Por míseros segundos, fragmentos de como tudo era antigamente, dissipam-se em breves instantes para darem lugar à triste realidade de hoje, à ausência de um fio condutor que me direcciona, neste caminho sem sentido, de múltiplos trilhos que me transportam para um único e errático fim.
Procuro, procuro, no meio do caos desordenado que esta casa se tornou, e, às tantas, encontro o caderno onde registo a minha vida, os meus tormentos, onde desenho percursos possíveis para uma fuga deste labirinto insondável, sufocante, omnipresente. Mas por mais que trace linhas sem paralelo na realidade, delineando um percurso difícil e penoso, pleno de cruzamentos sem intersecções, depois de vaguear por círculos intermináveis e submergir em espirais infindas que me transportam ao abismo, regresso sempre ao mesmo ponto de partida – o da inutilidade da procura, da imensidão que se desbarata na conquista do nada, na vacuidade definida em acidentes de percursos inexistentes.
Tenho de sair daqui, e depressa.
Tranco a porta atrás de mim e deambulo pelas escadas imundas, encardidas de tantos outros a traçarem percursos idênticos, escada acima, escada abaixo, sempre a caminharem para o mesmo triste destino que aqui não se encontra, porque o ar é demasiado opressivo para que o consigamos aprisionar. Haverá alguma coisa na vida que nos pertença de facto…? Não, não é aqui, nesta imundície de almas que se atropelam entre si e que nos incomodam, até termos de dizer - Basta! Larguem-me que eu não vos pertenço!
Tenho de sair daqui!

(continua aqui)

quinta-feira, 29 de julho de 2010

experiência de escrita 3

(continuação do texto publicado aqui)
 
Demasiado tempo, demasiado, que se esboroa por entre o delicado entrelaçado dos nossos dedos e que nos faz sentir se não teremos ido, mais uma vez, um pouco além do que deveríamos, forçando a corda mais um milímetro, até ao desastre total que se adivinha por este lados.
Não era suposto que isto acontecesse, não tinha, do todo, sido programado que tal pudesse algum dia acontecer, mas foi o que sucedeu, e não há volta a dar, nada a fazer, quando as evidências nos apontam na mesma direcção, a do infindo e breve pesar, sem limites recortados em papel ou decalcados da laje fria e lazarenta aos nossos pés.
Recordo-me de um outro tempo em que tudo era diverso do actual, tudo era diferente no essencial, e se diluía continuamente em terrenas, inconsequentes incertezas sem propósito nem agravo considerável.
Em atropelos continuados, os soluços sobrepõem-se às palavras que poderia proferir, aos sentimentos que poderia definir, aos acontecimentos que poderia imaginar. Já nem o cigarro me conforta, de tal modo sorvido foi, já nada lhe resta, tal como a mim. Vazia por dentro, desprovida de conteúdo, uma massa ausente de sentido e informe na ligeireza distante da luz difusa que preenche esta sala aonde me encontro.
Detenho-me um pouco mais por entre estes negros e profundos instantes decepcionantes, mas sinto, está na hora de partir. Tenho de tirar as calças, recordam-me demasiado de tudo o que aconteceu, perfuram-me a mente com recordações obtusas e inconvenientes.
Tenho de sair, agora. Visto uma coisa qualquer do monte da roupa. Se estes pormenores nunca foram importantes, neste momento, ainda menos o são. Qualquer coisa serve, quem estará lá para me dizer que deveria cuidar do meu aspecto, que deveria fazer jus ao meu género? O cabelo desalinhado fica, não tenho por quem o cuide, para quem o penteie. Isso tudo acabou, ontem, foi-se, como um pedaço imprestável de papel, um fragmento partido de um copo, uma beata sorvida até ao fim.

(continua aqui)

quarta-feira, 28 de julho de 2010

experiência de escrita 2

(continuação do texto publicado aqui)

Não sei o que deva fazer a seguir. Ficar, fugir? É tudo demasiado doloroso, todas as frestas na parede mo recordam, toda a mágoa recalcada pela violência, marcada pela fealdade do momento em que, por fim, cedi.

Porque é que tinha de acontecer? Momento errado, local errado? Uma das poucas certezas na vida que podemos ter é a de que, mais cedo ou mais tarde, a espiral imunda e negra dos acontecimentos delineados na podridão da mente humana nos apanhará, a teia infecta tecida em momentos de vileza sórdida e agreste nos agarrará, impedindo-nos de fugir.
Atropela-se na minha mente um sem número de recordações, que me fazem retroceder pelas escadas íngremes da desilusão extrema e das profundezas do abismo sem retorno. Sorvo mais um gole deste café imundo e agarro-me à réstia de realidade que se consome no fumo do cigarro, de odor intenso e vibrante.
Negro, profundo e errático.

(continua aqui)

segunda-feira, 26 de julho de 2010

experiência de escrita 1

Por estes dias, apeteceu-me tentar escrever um conto. Apesar de saber como termina, não sei que caminhos há-de trilhar. E começa assim:

Acordo.
Olho para o lado da cama e vejo a ausência, recortada na dúbia presença de duplo sentido, da causalidade sem nexo nem alma.
Era mesmo esta sensação que me faltava ao acordar – a do negro desapontamento, a da morna insatisfação da solidão e a consciência do isolamento em que tenho vivido. Sempre.
Mas vamos acordar - levantar é preciso, ainda que sem motivo para o fazer.
A manhã já vai longa e cinzenta. Chove lá fora, aquela chuva miudinha que nos incomoda e nos gela a alma se a aguentarmos por muito tempo. A tristeza instala-se na consciência e fica para o jantar, ou talvez mais, se a deixarmos.
Seguro um cigarro entre os dedos e acendo-o sem o olhar, sem o sentir. Sabe tão bem saboreá-lo, antes de qualquer outra coisa… talvez fume há demasiado tempo, há demasiados anos. Ou décadas. Mas sabe-me sempre como o primeiro. Ou como o último.
O dia de ontem vem-me à memória, renovando a consciência da desilusão e pesar que se liquefaz por entre o fumo que se me escapa entre os dedos.
Dirijo-me para a cozinha e aqueço o café de há três dias, que me serve como num dia qualquer e detenho-me a contemplar a caneca, usada, negra de tão usada, à espera da reforma que lhe nego, uma e outra vez, obrigando-a a cumprir a sua função até ao fim dos seus dias, até ao final dos tempos, até que se queira quebrar. E porque não hoje? Atiro-a contra a parede com força, desfaço-a em mil pedaços, libertando a sensação de uso e de abuso de um objecto que já me deu tudo o que tinha para dar. É melhor sacar de um copo ou coisa do género para beber o café. Começamos mal, mas começamos…
Não tenho nada por que me levantar, ninguém que me aguarde com impaciência, nenhum serviço incompleto que precise de mim e unicamente de mim. Porque o que faço, qualquer um o pode fazer. Pois que o faça, eu não quero saber, fico-me por aqui a contemplar o café morno, bebendo-o, entrecortado pelo fumo cinzento e desiludido.
O dia de ontem passou e com ele qualquer réstia de esperança. Não vale a pena continuar, dei tudo o que tinha para dar, fiz tudo o que havia para fazer, até á exaustão. Já de nada vale a pena, ninguém procurará por mim e me virá perguntar como me sinto ou como me tenho conseguido aguentar. Estou só, como sempre estive, mas desta vez a consciência do facto é mais presente, audível como o silencio gritante que se anuncia por entre as paredes e se dilui pelos eternos minutos do relógio de parede. Atrasado cinco minutos, sempre atrasado cinco minutos, por mais vezes que eu o acerte, lá volta ele ao atraso de cinco minutos, como se aquele fosse o tempo próprio dele e não aquele com que nos controlam a vida.
A vida. O que aconteceu até aqui, todos os momentos de fúria, toda a insanidade dilacerante que se apresentou sem aviso e me fez agir de modo adverso ao normal, ao aceitável?
E o que fiz eu, que poderia ter feito de diferente? Terei agido de modo tresloucado, como uma velha senil, ou demente ou como um epiléptico sem remédio? E como poderia ter agido de outro modo, se não sei, de antemão, a direcção que tomam os meus sentimentos e de onde provém toda a violência que em mim sinto? Como poderia saber como agir a seguir àquele doloroso momento em que vi o que vi, senti o que senti, pensei o impensável, disse o indizível e reagi violentamente, sem apelo nem agravo, sem contemplações fúteis nem escusadas delicadezas?
Sabe-me tão bem o sabor do cigarro. Finalmente algo me dá atenção e se preocupa comigo – uma beata carcomida e sorvida até ao tutano que, a espaços, me vai satisfazendo. O ego...?
Termino o café, apreciando a borra no fundo do copo – ditará o meu futuro, a partir deste momento? Que forma tem esta mancha? Imprecisa e indefinida ou bem marcada e trivial? Meu deus, preciso de outro cigarro, antes que tome consciência desta inutilidade…
Volto para a cama ou ausento-me na contemplação do infinito que não me leva a lado nenhum? Que só me faz dispersar a mente pela vulgaridade dos sentimentos do dia de ontem, pela frieza das criaturas que me rodearam e aguçaram em mim o sentimento de não pertencer a lado nenhum, de ninguém me poder acompanhar pelos enlameados e taciturnos degraus de uma vida sem causa, sem propósito ou companhia.

Vou para o pé da cama, mas detenho-me a contemplar novamente a ausência do outro lado da cama, do que poderia ter sido, se. Se, se, se… Demasiadas condicionantes para um mesmo e único fim.
Foi um pedaço de mim que se dispersou por entre aquelas paredes sem cor e sem brilho. Uma tristeza inaudita, um território nunca encontrado a que pudesse chamar de lar. Tudo o que aconteceu antes levava à mesma conclusão, à mesma evidência, mas evitei encará-la de frente a todo o custo, sem sequer a olhar de cima para ter uma visão global da coisa. Da coisa em si, do acontecimento em espera ou do facto consumado. Tivesse alguma vez pressentido a ventania aziaga que se fazia sentir, e poderia tê-lo evitado, ou assim o quisesse. Talvez tenha caminhado para a destruição conscientemente, despudoradamente. Sem pensar duas vezes, sem ponderar as consequências que agora me fazem sentir assim – imprestável, inábil e corrompida, até ao limite.

(continua aqui)

terça-feira, 22 de junho de 2010

Mudança de blogue para site

Todos os escritos deste blogue, publicados entre Setembro de 2007 e Dezembro de 2009, foram transferidos para esta página do meu site.
A minha biografia e preferências foram transferidos para esta página.
Para qualquer comentário, estarei contactável através deste endereço.
Obrigada pela visita.